Simplicidade, tradição e inovação são a tríade que inspira Daniel Ferreira, chef do Corrupio, em Lisboa. Ainda em criança, deslumbrado pelos cozinhados das avós e pela azáfama do restaurante do tio, começou, sem querer, a construir um percurso dedicado à gastronomia.
Vinagre
A acidez «torna interessante» qualquer prato enfadonho. «É aquilo que nos faz salivar e, acima de tudo, ter vontade de continuar a comer», diz o chef, que destaca também a ligação emocional. «Amo pickles, o meu pai ama pickles. À nossa mesa havia sempre um frasco deles.»
Era uma vez um menino com uma avó alentejana e uma avó da zona Oeste. «De férias, em criança, ou estava no campo, na Lourinhã, a apanhar batatas e peras e a comer peixe cozido e frango do campo, ou estava em Garvão, a comer favas com chouriço e a apanhar azeitonas», conta.
A herança familiar e a influência das avós, ambas «ótimas cozinheiras», ditaram o caminho de Daniel Ferreira, 35 anos, responsável pela cozinha do Corrupio, em Lisboa, um restaurante português com um toque de modernidade. «O gosto pela acidez, por cominhos, alho, hortelã e coentros… tudo isso vem delas. São memórias que te marcam para a vida e, acima de tudo, te moldam para ela.» Mas o destino cimentou-se também com a intervenção do tio, proprietário de um restaurante em Alfama. «Sempre que íamos lá jantar punha-me na janela da cozinha e eu adorava aquilo: os aromas, o calor, o stress, era incrível.»
Foi lá que teve a primeira experiência profissional, a trabalhar ao fim-de-semana, com 17 anos. Tirou o curso de cozinha aos 19 e, desde então, nunca mais parou. São «várias histórias, vários sítios, vários chefs, vários amigos que fiz e já lá vão quase 12 anos», recorda.
Hoje comanda a cozinha do Corrupio, no Cais do Sodré, «um restaurante português de balcão, com boa comida, bom vinho, bom serviço, boa música e boa disposição». Por lá, pratos como a salada de polvo com batata-doce, a entremeada de laranja, «que comia no Alentejo», o arroz de cabrito e o bolo de bolacha, feito com bolacha americana, nata, morango e chocolate, representam «tradição, inovação e criatividade» e já se tornaram emblemas do menu desta casa, com as portas abertas desde setembro de 2022.
Daniel cresceu na margem sul, na Amora, «um sítio incrível» onde, quem sabe, um dia poderá ter um espaço próprio. Por enquanto, dá cartas no Corrupio, valorizando o que é nosso, tentando aprimorar o que fazemos bem há vários anos e sempre com a consciência de que «as coisas mais simples são as melhores». No entanto, reconhece que «não é fácil, com tantas influências, fazer algo puro e tradicional».